domingo, 29 de junho de 2008

Qualquer canto é melhor que a vida de qualquer pessoa*

Vá e leve contigo tuas cinzas, teus beijos
Vá e leve as coisas que fizemos juntos
Ah, é como o céu e o sol que brilha
Mesmo quando não quero, canto.

Essas histórias são pra sempre minhas
Essas dores, esses amores são meus
Eu sei que é difícil descrever sentimentos
Às vezes é só o som da minha voz que ecoa.

Vá embora de uma vez
Não ouse deixar recado de despedida
Eu falei demais
Devia dar menos de mim a você
Talvez assim você me escutasse.

A chama do amor me chama ao fundo do poço
O doce sabor da derrota amarga a minha boca
É estranho, mas me sinto bem assim
Tão só, tão só, tão só...
A escuridão, a gota d’água
Dissolve o sal das lágrimas que caem
Perde o gosto te perder
E dor às vezes parece linda
Mas prefiro lutar.

Às vezes é só o som da minha voz que ecoa
Longe, essas histórias que são pra sempre minhas
Vão levar o meu canto a todos os cantos.


* Como nossos pais, Belchior.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Nuvens terrenas

Você sabe quem eu sou?
Eu sou a poesia
E toda poesia é dor misturada a rebeldia
A dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional
A poesia é um crime passional
que se reflete no mundo,
na vida.

Sou a arte pintada pra quem não enxerga
A nona sinfonia para surdos
Sou a morte, sou as mazelas dos fracos
de quem tem medo do mundo,
da vida.

Quer saber quem eu sou?
Sou a loucura, prazer em conhecer
Um anjo cheio de ternura que caiu das nuvens
por querer saber do mundo,
da vida,
E se a terra também é eterna.

Sou a imaginação apegada às coisas terrenas
Sou o lorde da redenção para aqueles que fogem da guerra
Sou a beleza das suas lágrimas
E suas lágrimas é libertação
Pise nas nuvens e veja como são firmes
Esse é o milagre de olhar com o coração
O chão é o inferno
O chão é o perdão
O chão é o abismo da crucificação.
O chão é desgraça
O chão é o alucinógeno que me traz inspiração
Eu me inspiro no mundo,
na vida
Como a vida é bela!

("Porque eu só canto só
E meu canto é minha solidão é minha salvação.
Porque meu canto retira meu lado mau
Porque meu canto é pra quem me ama
É o que me mantêm vivo..." - Cazuza)

sexta-feira, 6 de junho de 2008

A Rosa de Espinhos de Aço


Os dias passam um atrás do outro
Cinco meses perversos me foram tomados
Mas vejo tudo como um sonho distante
Parecem anos, parece que nada aconteceu.
Os outros padecem, a minha mão vos ofereço
Porque suas mudanças dóem e eu sinto como se eu tivesse nascido assim
Me valho dos meus versos – à boca da noite ou do dia, já não importa -
As coisas não feneceram diante dos meus olhos
O sol continua a brilhar em minhas retinas, a rosa não secou
Nem secará jamais.
Me vesti toda em alma, matéria já não sou
E eu realmente sinto como se eu tivesse nascido assim
O passado. Ah, como o passado me parece presente
Talvez seja eterno, não é estático. Revivo.
Se tudo é história não reclamo do advento de novos dias
Dias bons ou maus são dias
e deles eu preciso.
Me alimento de luz e sombra
Sol e lua em movimento fazem crescer assim toda a vida
Eu sou rosa de espinhos de aço
Colho do vento as sementes que ele me traz
Enquanto o poeta canta me contando os novos dias.
As palavras nunca morrem
Os documentos nunca são superados
Os jornais velhos me contam um mundo novo...
Me perdi no tempo e no espaço
Relógio e calendário nada significam a não ser os dias que eu tenho
e parece que eles também me têm
Os dias me são infinitos talvez por isso nunca morrerei.
Mas não posso mentir
Tenho medo
Medo de não superar
Medo dos dias me vencerem
Acabando com a minha ilusão de que tudo me é infinito
E realmente muito me é infinito
Mas não pessoas
Elas murcham como flores na madrugada
Os veios de suas folhas, as veias de sua carne
Em verdade temos medo. Nascemos escuro.¹
Mas esquecemos. O dia perdoa.²





1 O Medo; Carlos Drummond de Andrade; in A rosa do Povo.
2 Onde há pouco falávamos; ibidem.