sexta-feira, 6 de junho de 2008

A Rosa de Espinhos de Aço


Os dias passam um atrás do outro
Cinco meses perversos me foram tomados
Mas vejo tudo como um sonho distante
Parecem anos, parece que nada aconteceu.
Os outros padecem, a minha mão vos ofereço
Porque suas mudanças dóem e eu sinto como se eu tivesse nascido assim
Me valho dos meus versos – à boca da noite ou do dia, já não importa -
As coisas não feneceram diante dos meus olhos
O sol continua a brilhar em minhas retinas, a rosa não secou
Nem secará jamais.
Me vesti toda em alma, matéria já não sou
E eu realmente sinto como se eu tivesse nascido assim
O passado. Ah, como o passado me parece presente
Talvez seja eterno, não é estático. Revivo.
Se tudo é história não reclamo do advento de novos dias
Dias bons ou maus são dias
e deles eu preciso.
Me alimento de luz e sombra
Sol e lua em movimento fazem crescer assim toda a vida
Eu sou rosa de espinhos de aço
Colho do vento as sementes que ele me traz
Enquanto o poeta canta me contando os novos dias.
As palavras nunca morrem
Os documentos nunca são superados
Os jornais velhos me contam um mundo novo...
Me perdi no tempo e no espaço
Relógio e calendário nada significam a não ser os dias que eu tenho
e parece que eles também me têm
Os dias me são infinitos talvez por isso nunca morrerei.
Mas não posso mentir
Tenho medo
Medo de não superar
Medo dos dias me vencerem
Acabando com a minha ilusão de que tudo me é infinito
E realmente muito me é infinito
Mas não pessoas
Elas murcham como flores na madrugada
Os veios de suas folhas, as veias de sua carne
Em verdade temos medo. Nascemos escuro.¹
Mas esquecemos. O dia perdoa.²





1 O Medo; Carlos Drummond de Andrade; in A rosa do Povo.
2 Onde há pouco falávamos; ibidem.

2 comentários:

Zúnica disse...

A rosa não secou, nem nunca secará, porque é toda alma. Os espinhos de metal não se curvam ao tempo, as pétalas de seda não fenecem à dor.

O passado, minha querida, se faz presente quando não é apenas passado. O passado se faz presente quando é mais presente que passado. Quando é mais futuro que passado.

Ouça o canto do poeta sobre novos dias. "Convive com teus poemas". convive com teus poetas.

Relógio e calendário nada significam à alma imortal, à eternidade de um verso, de um beijo, de um raio de Sol.

Tema, que é ainda humana - a mais humana das mulheres. Mas não fraqueje, que teus espinhos de aço não perdem a majestade diante da ferrujem. Apoie-se em teus versos, que eles não murcharão em mil madrugadas. Apoia-te em teus espinhos. "...espinho não machuca a flor".

Você é o que o teu espelho te diz; Pode ser o que o mundo te mostra; Pode ser o que o poeta canta. Sim, você escolhe.

Sim, é realmente uma flor...
E é linda

Caranguejo Excêntrico disse...

Ah. Lindas palavras, minha querida!

"Me vesti toda em alma, matéria já não sou"

Não tenho mais o que dizer, a não ser o silêncio.

E, ah, tô te devendo uma visita, mesmo! A vida tá corrida, na rotina, por aqui, mas espero ainda esse mês ir até aí pôr as fofocas em dia!
Saudadocê, fiah!

Beijo!